Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa - ISCTE
Secção Autónoma de Direito
Mestrado "Novas Fronteiras do Direito"
Actualizado em Junho de 2005

Novas Fronteiras do Direito
no "site" do ISCTE

 

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Apontamentos sobre o texto de Niklas Luhmann, "O Direito Positivo e a Ideologia" (1967)

por Elsa Benrós
Texto elaborado a partir de uma exposição feita no âmbito da disciplina 
Direito e Sociedade

Niklas Luhmann natural de Lüneburg, na Baixa Saxónia, Alemanha, nasceu a 18 de Dezembro de 1927 e morreu a 6 de Novembro de 1998.

Estudou Direito na Universidade de Freiburg de 1946 a 1949, tendo de imediato iniciado a sua carreira na Administração Pública. Foi para Harvard em 1961, estudar sociologia com Talcott Parsons. Em 1962, e já de regresso à Alemanha, foi para o “Hochschule für Verwaltungswissenschaften” (Instituto de Spira), onde desenvolve uma carreira de investigação até 1965, ano em que, través de Helmut Scelsky, vai para a Universidade de Munique, onde obteve cátedra em 1966. De 1968 a 1969 deu aulas na Universidade de Frankfurt, cujo responsável pela cadeira era Theodor Adorno. Tendo sido nomeado como Professor da cadeira de sociologia na Universidade de Bielefeld, na Alemanha, entretanto criada, onde se manteve até 1993.

Lumahnn foi um profícuo escritor, tendo versado sobre várias áreas, desde a sociologia, à lei, à economia, à política, à arte, à religião, à ecologia, ao mass media e ao amor.

Na área dos sistemas sociais Luhmann destacou-se pelos seus estudos de sociologia do direito. Constituindo o texto do direito positivo e ideologia um dos textos mais recuados no tempo, o que se verifica desde logo pela ausência de alguns conceitos paradigmáticos. Nele, Luhmann inicia a sua reflexão sobre a direito e a ideologia partindo da observação de um passado próximo, para depois recuar a um passado longínquo. O autor considera os últimos 200 anos e chega à conclusão que a confiança na capacidade da lei para disciplinar a ordem social tem-se desvanecido. A grande época do direito natural ficou para trás. Nem mesmo a visão de Marx sobre a lei e a ideologia podem ser adoptadas com convicção. Para Marx a lei deveria ser encarada como o instrumento da ideologia, como expressão dos interesses económicos da classe dominante. Bastando alterar-se a lei, e adoptar-se medidas que permitissem a expropriação para surgir uma revolução social, a fim se estabelecer uma ordem social livre da ideologia.

O pensamento grego, por seu lado, vai para além da lei sancionatória, na tentativa de alcançar o princípio subjacente, que para eles é a justiça. Princípio esse caracterizado de modo mítico e racional, através da equidade.

Ideia essa bastante ambivalente, que permite toda uma série de interpretações.

Com Aristóteles o caminho entre o pensamento mítico e o pensamento racional passa a percorrer diverso percurso. A teoria da justiça e a teoria da sociedade passam a ser observados não com base na teoria das boas acções, mas de acordo com a correcção de uma acção julgada atendendo à culminação do seu objectivo. (Isto explica porque é que a descrição da sociedade politicamente constituída foi desenvolvida a partir da teoria da acção – vislumbra-se no objectivo da acção individual do sujeito, relativamente aos outros, apresentar um caracter ameaçador ou cooperativo.)

O desenvolvimento tardio do conceito de justiça á data, deveu-se ao facto de ter sido considerado como parte da ética. O que explica, também que a descrição das sociedades politicamente constituídas tenha sido abordado do ponto de vista da teoria da acção. Nestes termos, a filosofia política tradicional, analisou dois grandes problemas: 1 o da “ameaça e dependência”, e 2 o da concepção de necessidades (metus e indigencia) e a dos objectivos da sociedade politicamente constituída (pax e justitia).

Com mais ou menos ênfase estas concepções deram, de algum modo, forma à história do pensamento político e legislativo. Podendo ainda ser encontrados na sociologia o contraste entre a cooperação e o conflito.

A relação entre o direito positivo e a ideologia depende do facto de ambos constituírem instituições de resolução de problemas.

Não será por acaso que ao mesmo tempo que o conceito de valor, passou a ser estudado, surgiu  a suspeita da ideologia, para se tornar quase universal, e observa-se a uma transformação no campo jurídico uma vez que o direito passa a positivo (constituem decisões do sistema político). A simultaneidade destes acontecimento sugere a necessária existência de ligações entre ambas. Que ligações serão essas?

O direito positivo é validado por decisões.

As conexões entre o direito positivo e a ideologia não resultam numa pura identidade, uma vez que isso implicaria uma fusão.

Luhmann questiona-se da possibilidade e das précondições que levam a sociedade a correr o risco de criar direito positivo?

No fundo, o direito não frui duma lei natural suprema que existe e que através das suas verdades objectivas obriga permanentemente.

A estabilidade e a validade do direito não repousam numa ordem superior e mais estável, mas sim no princípio da variação. O segredo do processo reside na susceptibilidade da lei poder ser alterada. Tal susceptibilidade fundamenta a sua estabilidade e validade. A lei positiva não pode ser considerada como pertencente a um nível inferior da hierarquia das fontes do Direito. O conceito de positividade legal deve fundamentar-se na teoria do processo de tomada de decisão.

Tendo surgido novas teorias que consideram que a existência da sociedade é independente dos objectivos "subjectivos" dos indivíduos. Pretendem essas teorias reduzir as orientações do agente individual a seus interesses económicos ou a sua "situação objectiva" e explicar a lei numa sociedade como um produto da ideologia.

Assim, com a diferenciação social, as subestruturas semi-autónomas servem como um elemento numa sociedade complexa. Com sua própria semi-autonomia e com aquela, daqueles elementos de complexidade externa, que contactam, cada um acede a uma pequena parte da variedade existente. Há assim, para Luhmann, uma redução da complexidade. Sendo certo que cada subestrutura estabelece entre todas as expectativas possíveis, uma selecção arbitrária limitada, que constrange o indivíduo pelo sistema a escolher. Estas subestruturas ganham sua estabilidade fornecendo aos membros da sociedade um sentimento comum do solidariedade, constituindo entre si uma relação.

Deste modo a lei positiva e a ideologia reduzem a complexidade do sistema ambiental. Ambos encontram-se separadas por subsistemas relacionados. Se por um lado o direito positivo afere-se às decisões do subsistema político a ideologia afere-se ao valor da estrutura social da sociedade. Assim o único elemento comum é a forma. O direito positivo ao passar por um filtro de reflexão dos membros da sociedade deve relacionar-se com as suposições, inclusive as suposições ideológicas da sociedade. Deste modo, a estabilidade e a validade da lei dependem do princípio da variação.

O direito positivo passa pelo crivo da reflexão por parte de quem a promulgou, e de quem a pôs em prática. Devida à sua característica de alterabilidade a sociedade passa a ter confiança nele, bem como na sua validade.

A ideologia, por seu turno, deve ser capaz de dirigir a escolha de valores programa, com os seus sacrifícios e renuncias, bem como, regular a substituição dos referidos valores. Assim, deve ser entendida como estruturas simbólicas que permitem à formulação de valores tornar-se reflexivo no aspecto do processo de tomada de decisão. A ideologia, tem assim a ver com a avaliação dos valores. Sendo certo que para Luhmann o valor é qualquer ponto de vista que especifique quais as consequências da acção preferíveis. Desse modo um valor absoluto não tem função, e por isso é imediatamente desacreditado.

O jogo de valores só é possível a partir do momento em que há uma hierarquia intrínseca dos mesmos.

Nestes termos a ideologia apresenta uma função instrumental. Devendo assim assegurar o consenso relativamente àqueles que têm os seus próprios valores (que terão que aguardar).

A ideologia terá de, algum modo, confortar aqueles membros cujos valores, ficaram em “stnad by”. O que revela a sua função simbólica. Devendo por isso as ideologias ser observadas como estruturas simbólicas que permitem à formulação de valores tornar-se reflexiva, e aumentar a capacidade e complexidade do processo de tomada de decisões.

Tal como se passa com ideologia o direito positivo constitui um sistema de nível mais elevado que confine as actividades dos povos que o seguem e ao mesmo tempo criam-no. Assim a reflexão no sistema ideológico constitui uma forma de auto-reflexão para os membros da sociedade. Com essa reflexibilidade os seguidores de um ideologia identificam-se com ela e contribuem para seu desenvolvimento. E como se trata de um sistema complexo, contém uma característica circular na medida em que o sistema é criado pelos membros, confina-os e também é modificado por eles.

                                                           

BIBLIOGRAFIA

Luhmann, Niklas – Sociologia do Direito(I,II)

Luhmann, Niklas – Direito positivo e ideologia

Luhmann, Niklas – Legitimação pelo Procedimento

Luhmann, Niklas – The Autonomy of the legal system

Luhmann, Niklas – La observation sociológica del derecho

Luhmann, Niklas –Social Systems

Luhmann, Niklas –Le Droit et Société dans la Sociologie

Winter de Carvalho, Délton – O Direito como um sistema Social Autopoiético: Auto-Referência, Circularidade, e Paradoxos do Teoria e Prática do Direito

Luhmann, Niklas – Speaking and Silence

Estrada, Isabel –A Caixa de Pandora

Guibentif, Pierre, e outros –Niklas Luhmann observateur du droit (recueil organisá par André-Jean Arnaud et Pierre Guibentif

Guibentif, Pierre – Sebenta – Sociologia do Direito

Trabalho de estudante elaborado por Elsa Benrós no âmbito da disciplina Direito e Sociedade do Mestrado 'Novas Fronteiras do Direito', no ano académico 2004-2005.

 

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