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      Apontamentos
      sobre o texto de Niklas LUHMANN – “La observación sociológica del
      derecho” [tradução do original “Die soziologische Beobachtung
      des Rechts”, in : Würzburger Vorträge zur Rechtsphilosophie,
      Rechtstheorie und Rechtssoziologie, Frankfurt am Main, Alfred Metzner
      Verlag, 1986, 47 pp., tradução esta publicada na revista Crítica Jurídica,
      12, “Homenaje a Renato Treves”, México, 
      Instituto de Investigaciones Jurídicas, 1993, 
      73 pp.]
      
      
      
       
      por
      Nuno Miguel Pereira Ribeiro Coelho
      
       
      Texto
      elaborado a partir de uma exposição feita no âmbito da disciplina  
      Direito e Sociedade
      
      
      
      
       
       
      A.       
      COMENTÁRIO SÍNTESE
      
       
      B.        
      COMENTÁRIO DESENVOLVIDO
      
       
      C.       
      REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
         
      A.
      COMENTÁRIO SÍNTESE
      
       
       
      I.
      A escolha, o contexto do artigo e o seu horizonte teórico.
      
       
      a.
      Niklas Luhmann é, para nós, o fundador de um verdadeiro “novo mundo”
      teórico que marcou e continua a marcar, de forma indelével, as múltiplas
      abordagens da realidade jurídica e, de um modo mais claro, a abordagem
      sociológica do direito.
      
       
      Trata-se
      de um dos autores mais sedutores ao nível da teorização social sobre a
      realidade do jurídico, no seu enquadramento mais vasto do sistema social,
      reconhecendo-se na sua obra uma deslumbrante capacidade de análise e de
      produção teórica, de oferta de um novo instrumental conceptológico ao
      meio cultural e científico das ciências sociais e do direito que se
      encontra perfeitamente assimilado pela mais recente discursividade do
      direito e da sociologia.
      
       
      b.
      O texto em causa, publicado em 1986 (data do original), situa-se numa fase
      de consolidação da teoria dos sistemas, logo após o aparecimento da súmula
      da teoria sociológica Soziale Systeme, em 1984, obra central no
      pensamento de Luhmann. A partir de 1988 (até 1998) Luhmann vai consagrar
      os seus esforços à realização de uma sociologia dos diferentes
      subsistemas sociais, articulando aquela teoria geral com os diversos domínios
      sociais: a economia, a ciência, o direito (com “O Direito da
      Sociedade” de 1993), a arte, a religião, a política, a educação e a
      própria teorização sociológica da sociedade.
      
       
      Neste
      contexto é que veio a surgir esta “observação sociológica do
      direito” de Luhmann, preocupado que se encontrava este autor com o porquê
      da distância tradicional entre o direito e a sociologia, e justificando a
      sua explicação com o enunciado de grande parte das questões que
      concentraram o seu percurso de sociólogo e de teórico do direito, desde
      a nuclear teoria dos sistemas auto-referentes e autopoiéticos aplicada ao
      campo do direito, devidamente caracterizada, até aos problemas que compõem
      a teoria e a dogmática jurídicas. Tudo para elucidar, a final, aquilo
      que distingue a “auto-observação” da “observação alheia ou heterónoma
      do direito”, e para esclarecer as condições estruturais que derivam da
      diferenciação funcional dos sistemas jurídico e científico nas
      sociedades modernas, a utilidade da sociologia do direito e as
      virtualidades do desenvolvimento dessa teoria sociológica para a
      investigação interdisciplinar.   
      
      
       
      c.
      Assim, nesta sua “observação sociológica do direito”, Luhmann
      assume a tarefa de delinear uma genealogia da sociologia do direito para
      servir de base a uma definição da autonomia do seu específico objecto e
      para construir, depois, um mapa das sucessivas aproximações e
      distanciamentos entre a sociologia e o direito.
      
       
      Sucedem-se
      neste texto em análise as citações de autores, de múltiplas origens
      disciplinares e críticas (sociólogos, cientistas, juristas, filósofos
      dos vários domínios {aqui incluindo a teologia}, hermeneutas,
      economistas, historiadores, politólogos, psicólogos sociais, entre
      outros), a propósito de um vasto conjunto de questões que fazem parte do
      universo teórico luhmanniano, numa busca constante dos vários sentidos
      possíveis e das plúrimas abordagens semânticas a propósito de cada
      tema ou conceito. 
      
       
      
      
       
      II.
      Em especial, a estrutura do texto e a reconstituição da investigação.
      
       
      O
      texto em análise é, no fundo, um “artigo-síntese” que expõe de uma
      forma global e articulada aquele que se pode considerar como o
      entendimento mais maduro de Luhmann sobre a análise sociológica do
      direito, já enquanto teórico dos sistemas e portanto com uma visão
      descomprometida e mais objectiva sobre as duas disciplinas em causa: a
      sociologia e o direito. 
      
       
      Com
      este artigo - denso e rico de conteúdo - Luhmann procura obter,
      fundamentalmente, como vimos, respostas para a questão da recorrente
      dificuldade de relacionamento entre o direito e a sociologia, podendo ser
      encontrados, na sua abordagem, quanto a nós, quatro grandes domínios temáticos
      (que não correspondem à divisão numérica inscrita no texto). 
      
       
      Nessas
      quatro áreas temáticas vamos encontrar o inventário de grande parte da
      conceptologia luhmanniana, desde logo os conceitos fundamentais
      salientados nas aulas do Prof. Guibentif de “sistema social”, de
      “diferenciação funcional” e de “articulação estrutural” entre
      cada um dos sistemas e o seu ambiente.
      
       
      Na
      primeira parte trata, Niklas Luhmann, da génese da sociologia e do seu
      objecto, onde se vai discernindo um enquadramento histórico do
      relacionamento entre a sociologia e o direito e as abordagens daquela ciência
      social à teoria e dogmáticas jurídicas.
      
       
      Depois,
      numa segunda etapa, traça o horizonte de caracterização dos sistemas
      auto-referentes e do seu modo de operação autopoiético com recurso ao
      sentido de identidade e diferenciação do sistema, incluindo nessa
      categoria o direito. 
      
       
      A
      partir dessa caracterização dos sistemas auto-referentes Luhmann vai
      partir para o desenvolvimento de um método comparativo que fundamenta a
      análise sociológica do direito como observação alheia ou heterónoma
      do jurídico.
      
       
      Assim
      colocado, munido já desse instrumento dual de análise (“auto” e
      “hetero” observação), Luhmann percorre, num terceiro passo, a sucessão
      das questões mais críticas da teoria e da dogmática jurídicas,
      enfrentando o desafio de delinear as explicações que dão corpo ao seu
      pensamento sistémico sobre o direito, isto a propósito da normatividade
      jurídica, da positividade e da validade do direito, da orientação pelas
      consequências, da argumentação jurídica e do princípio da justiça. 
      
       
      Numa
      quarta e última parte, Luhmann, em jeito de conclusão, questiona-se
      sobre a utilidade do papel da sociologia do direito, tanto no plano
      interno do desenvolvimento da teoria sociológica como a propósito da
      influência dessa mesma disciplina no contexto mais vasto da investigação
      interdisciplinar. 
      
       
      A
      sociologia enquanto observação externa e distanciada do sistema jurídico
      pode oferecer, afinal, à auto-observação da teoria do direito, afirma
      Luhmann, um outro sentido e uma outra superfície visível aos temas
      centrais suscitados: a normatividade jurídica, a positividade e a
      validade do direito, a orientação pelas consequências, a peculiaridade
      da argumentação jurídica e o princípio da justiça.
      
       
      
      
       
      III.
      Conclusões e apreciações finais.
      
       
      A
      proposta de Luhmann lançada neste artigo pode, na nossa óptica, ter a
      seguinte leitura: é preciso conhecer a “chave” deste sistema jurídico
      para melhor conseguir lidar com as suas características essenciais e com
      o seu mecanismo vital. O seu fechamento funcional e identificador e os
      limites da sua abertura, assumidos como condições da sua análise e da
      produção de modificações na sua estrutura e na sua substância.    
      
      
       
      São
      particularmente ricas de consequências, quanto a nós, neste artigo, as
      explanações de Luhmann relativas: 
      
       
      a.
      - à natureza comunicante do sistema jurídico enquanto inserido na
      sociedade; 
      
       
      b.
      - ao carácter tautológico e paradoxal do funcionamento do sistema jurídico
      que convive com um discurso de encobrimento e de apologia da perfeição
      normativa;
      
       
      c.
      - às potencialidades explicativas da hipótese autopoiética para o
      delineamento dos elementos constitutivos do sistema judicial (sub-sistema
      de realização ou aplicação do direito); e
      
       
      d.
      - ao reconhecimento de uma fórmula de obtenção de um nível melhor e
      maior de relacionamento do direito com as ciências sociais que com ele
      concorrem na percepção e na actuação sobre a realidade social. 
      
       
       
      
       
      B.
      COMENTÁRIO DESENVOLVIDO.
      
       
      I.
      A escolha, o contexto do artigo e o seu horizonte teórico.
      
       
      a.
      A escolha de um autor como Niklas Luhmann e deste seu texto em particular
      serve, por um lado, razões de eleição de pesquisa para uma futura tese
      de mestrado e, por outro lado, motivos de apetência pessoal. Um crescente
      interesse por conhecer melhor, agora de um modo mais estruturado e
      disciplinado, este verdadeiro “novo mundo” teórico que marcou e
      continua a marcar, de forma indelével, as múltiplas abordagens da
      realidade jurídica e, de um modo mais claro, a abordagem sociológica do
      direito.
      
       
      Trata-se
      de um dos autores mais sedutores ao nível da teorização social sobre a
      realidade do jurídico, no seu enquadramento mais vasto do sistema social,
      reconhecendo-se na sua obra uma deslumbrante capacidade de análise e de
      produção teórica, de oferta de um novo instrumental conceptológico ao
      meio cultural e científico das ciências sociais e do direito que se
      encontra perfeitamente assimilado pela mais recente discursividade do
      direito e da sociologia.
      
       
      Basta
      aqui recordar, no mundo do direito, o pensamento sucessor de Günther
      Teubner na teoria do direito e com maior incidência no direito civil e
      económico, e de Günther Jakobs, com a sua teoria do delito no direito
      criminal. Ou mesmo no direito processual com a influência manifesta,
      agora não precisamente da teoria dos sistemas, mas da mais recuada
      “Legitimação pelo procedimento” (1969). 
      
       
      No
      decorrer da análise do texto ficam patentes as outras razões desta opção,
      mas pode-se acrescentar desde já que se trata, este mesmo texto, de um
      “artigo-síntese” que expõe de uma forma global e articulada aquele
      que se pode considerar como o entendimento mais maduro de Luhmann sobre a
      análise sociológica do direito, já enquanto teórico dos sistemas e
      portanto com uma visão descomprometida e mais objectiva sobre as duas
      disciplinas em causa: a sociologia e o direito.  
      
       
      b.
      O texto em causa, publicado em 1986 (data do original), situa-se, na
      verdade, numa fase de consolidação da teoria dos sistemas, logo após o
      aparecimento da súmula da teoria sociológica Soziale Systeme, em 1984,
      obra central no pensamento de Luhmann e onde este lança uma formulação
      global e durável do conjunto dos elementos e da estruturação
      institucional dessa teoria geral. A partir de 1988 (até 1998) Luhmann vai
      consagrar os seus esforços à realização de uma sociologia dos
      diferentes subsistemas sociais, articulando aquela teoria geral com os
      diversos domínios sociais: a economia, a ciência, o direito (com “O
      Direito da Sociedade” de 1993), a arte, a religião, a política, a
      educação e a própria teorização sociológica da sociedade.
      
       
      Neste
      contexto é que veio a surgir esta “observação sociológica do
      direito” de Luhmann, preocupado que se encontrava este autor com o porquê
      da distância tradicional entre o direito e a sociologia, e justificando a
      sua explicação com o enunciado de grande parte das questões que
      concentraram o seu percurso de sociólogo e de teórico do direito, desde
      a nuclear teoria dos sistemas auto-referentes e autopoiéticos aplicada ao
      campo do direito, devidamente caracterizada, até aos problemas que compõem
      a teoria e a dogmática jurídicas: a normatividade jurídica, a
      positividade e a validade do direito, a orientação pelas consequências,
      a peculiaridade da argumentação jurídica e o princípio da justiça
      (temas depois retomados com maior desenvolvimento no “O Direito da
      Sociedade” de 1993). Tudo para elucidar, a final, aquilo que distingue a
      “auto-observação” da “observação alheia ou heterónoma do
      direito”, e para esclarecer as condições estruturais que derivam da
      diferenciação funcional dos sistemas jurídico e científico nas
      sociedades modernas, a utilidade da sociologia do direito nesse conspecto
      e as virtualidades do desenvolvimento dessa teoria sociológica para a
      investigação interdisciplinar.   
      
      
       
      c.
      Assim, nesta sua “observação sociológica do direito”, Luhmann
      assume a tarefa de delinear uma genealogia da sociologia do direito para
      servir de base a uma definição da autonomia do seu específico objecto e
      para construir, depois, um mapa das sucessivas aproximações e
      distanciamentos entre a sociologia e o direito, enumerando os autores de
      referência desse enquadramento simultaneamente evolutivo e temático. Com
      vista a esse desiderato parte substancial do artigo é dedicado a um visão
      dual - auto-observação v. hetero-observação - sobre as questões
      centrais da teoria e dogmática jurídicas acima aludidas, o que confere
      ao texto uma riqueza acrescida para o leitor que tenha uma formação
      assumidamente jurídica, no confronto gerado com análises diferenciadas
      das suas categorias e artefactos próprios, alargando os seus horizontes
      de compreensão das realidades jurídica e social. 
      
       
      Sucedem-se
      neste texto em análise as citações de autores, de múltiplas origens
      disciplinares e críticas (sociólogos, cientistas, juristas, filósofos
      dos vários domínios {aqui incluindo a teologia}, hermeneutas,
      economistas, historiadores, politólogos, psicólogos sociais, entre
      outros), a propósito de um vasto conjunto de questões que fazem parte do
      universo teórico luhmanniano, numa busca constante dos vários sentidos
      possíveis e das plúrimas abordagens semânticas a propósito de cada
      tema ou conceito. 
      
       
      O
      que não pode deixar de reflectir o conhecido método de trabalho do teórico
      dos sistemas, com a pesquisa de “palavras-chave” na sua caixa de
      fichas e de índices – que lhe possibilitou múltiplas conexões entre
      as entradas existentes – e com a mecânica associativa de pensamento que
      lhe está inerente. Mas também um hiper e invejável domínio (se se pode
      assim dizer) de vários conteúdos temáticos e de múltiplos saberes que
      entronca num discurso síntese de articulação complexa mas que é
      impulsionado pelas ideias centrais mais simples e unitárias do
      funcionamento sistémico.
      
       
      Confirma-se
      justamente esta acepção no rol de autores que vamos encontrando neste
      texto em abordagem a propósito:  
      
       
                 
      - da génese da sociologia e da definição histórica do seu
      objecto, com referências aos defensores da integração normativa ou
      “inclusão moral” - Durkheim / Talcott Parsons - e da teoria da acção
      - Philippe Van Parijs e C. Wright Mills -;
      
       
                 
      - do
      enquadramento histórico do relacionamento entre a sociologia e o direito,
      a começar por Hermann Kantorowicz, e das razões do distanciamento entres
      essas disciplinas - Helmut Schelsky e Gilbert Geis -;
      
       
                 
      - da
      multiplicidade das possíveis áreas de abrangência da sociologia e do
      deficit de análise desta disciplina também no que respeita à abordagem
      da dogmática jurídica, não obstante os esforços mais ambiciosos, em
      termos gerais, de Max Weber, Scheler, Simmel, Mannheim ou mesmo de Norbert
      Elias com a sua teoria do processo da civilização;
      
       
                 
      - da teoria dos
      sistemas auto-referentes e autopoiéticos - 
      na sua componente original da biologia com Humberto Maturana e
      Francisco Varela e na sua acepção mais ampla com Milan Zeleny, Paul
      Dumouchel, Jean-Pierre Dupuy, Hans Ulrich e Gilbert J. B. Probst 
      - e desta teoria dos sistemas sociais (remissão para a sua obra
      Soziale Systeme. Grundrib einer allgemeinen Theorie) como auxiliar da análise
      do relacionamento distanciado da sociologia;
      
       
                 
      - dos limites da
      lógica valorativa sobretudo no que respeita aos objectos auto-reflexivos
      e aos factos sociais - Ranulph Glanville, Gottard Günther e remissão
      para as suas obras que reflectem estas preocupações para os vários
      sistemas funcionais com características de auto-referência (política,
      arte, economia e ciência) - e das virtualidades explicativas da autonomia
      dos sistemas sociais funcionais para a compreensão do jurídico;
      
       
                 
      - da caracterização
      dos sistemas auto-referentes no que respeita ao seu fechamento e abertura
      relativamente ao seu ambiente externo - Heinz von Foerster, Henri Atlan e
      o citado Francisco Varela -, do seu modo de operação autopoiético com
      recurso ao sentido de identidade e diferenciação do sistema - a sua obra
      Soziale System e George Spencer Brown -, da tautologia inerente a essas
      operações de identidade sistemática 
      - Sidney Shoemaker e Henrich Dieter -, da sua produção de
      paradoxos internos e de uma teia confusa de hierarquias em virtude da
      operação de auto-referência e da utilização da negação no
      funcionamento interno e normal do sistema - Torsten Eckhoff e Nils
      Kristian -,  e dos colapsos
      ocasionados pela diferença entre sistema e ambiente aplicada dentro do próprio
      sistema - Douglas R. Hofstadter, Josef Esser, Walter Benjamim e Eliglio
      Resta -;   
      
       
                 
      - do discurso interno no sistema que tende a assumir um
      relacionamento oculto com o paradoxo e a tautologia, afastando, por
      encobrimento, a expressão da arbitrariedade e do bloqueio nas operações
      respectivas - Paul Dumouchel -;
      
       
                 
      - da utilização
      dos critérios operativos de caracterização do direito como sistema
      auto-referente para o desenvolvimento de um método comparativo e para
      fundamentar a observação sociológica do direito como observação
      alheia ou heterónoma do jurídico, para além das tradicionais soluções
      de cariz semântico ou fórmulas metafóricas (v.g. da violência) 
      -  Hans Blumenberg,
      Jean-Jacques Rousseau, René Girard, Michel Aglieta, André Orléan,
      Otthein Rammstedt, os citados Francisco Varela, 
      Van Parijs e Spencer Brown,  e
      o próprio autor em Die Theorie der Ordnung und die natürlichen Rechte -;
      
      
       
                 
      - da
      auto-observação e da hetero-observação de determinadas questões
      centrais da teoria e da dogmática jurídicas, como acontece com a
      normatividade jurídica - o próprio autor em Die Einheit des
      Rechtssystems e Rechtssoziologie, Lawrence M. Friedman, os citados Max
      Weber e Emile Durkheim, Nicholas S. Timasheff, Theodor Geiger, Paul
      Bohannan, Rüdiger Lautmann, Milton Omam, Richard F. Tomasson, Shalom H.
      Schwartz, Sybille Sukale-Wolff, Barbara Frankel, Heinrich Popitz, Gerd
      Spittler e Rolf Ziegler -, a positividade e a validade do direito – o próprio
      autor em Die juristische Rechtsquellenlehre aus soziologischer Sicht, Jürgen
      Bluhdorn, Ciro Spontone, Norbert Achterberg, Werner Krawietz, o citado Max
      Weber, Bernd Rüthers -, a orientação pelas consequências – o próprio
      autor em Rechtssystem und Rechtsdogmatik, Ronald Dworkin,Gunther Teubner,
      Reinhard Damm, Christian Schöneborn, Thomas Sambuc, Thomas W. Wälde, Ts.
      Königstein, Gertrude Lübbe-Wolf, Hubert Rottleuthner, Wienfried
      Hassemer, Johann Gottlieb Buhle, Edwin Norman Garlan, Richard B. Brandt e
      Otfried Höffe -, a peculiaridade da argumentação jurídica – Kenneth
      Arrow, Adalbert Podlech, Herbert A. Simon, Anatol Rappaport, Albert R.
      Chamnah, Amélie O. Rorty, Theodor Viehweg, Chaim Perelman, Werner
      Krawietz, Robert Alexy, o citado Helmut Schelsky, Jan Ray, Joachim
      Hruschka, Elmar Bund, Werner Hardwig, Dieter Nörr, Jan Schapp, Alois
      Hahn, o próprio autor em Legitimation durch Verfahren, Vilhelm Aubert,
      Michel Gauchet, Jürgen Habermas, o citado Talcott Parsons, Paolo
      Cappellini, Helmut Coing, Claus-Wilhelm Canaris, Hans-Martin Pawlowski,
      Werner Krawietz, Franz-Josef Peine - e o princípio da justiça – Aristóteles,
      Arthur Kaufmann, Jean Delumeau, Peter Michael Spangenberg, o citado Ciro
      Spontone, Jacques Necker, Melvin J.Lerner, Richard G. Graf, Duane Green,
      Leibniz, o citado Walter Benjamim, Roy A. Rappaport, Edmond N. Cahn, o
      citado Joseph Esser, Karl Popper, Siegfried J. Schmidt, o próprio autor
      em Gerechtigkeit in den Rechtssystemen der modernen Gesellschaft, Ralf
      Dreier e Vilhelm Aubert -;  
      
       
                 
      - e, como conclusão,  da
      utilidade directa da sociologia do direito no plano interno do
      desenvolvimento da teoria sociológica e da influência dessa mesma
      disciplina no contexto mais vasto da investigação interdisciplinar, em
      que as diferenças indissolúveis entre a auto-observação e a observação
      alheia do sistema jurídico servem para fundar, afinal, embora com grandes
      reservas relativamente a interpenetrações que não sejam ocasionais, um
      sentido unitário do reconhecimento do idêntico na diferença com a
      ampliação dos âmbitos de contacto mediante a discussão teórica
      direccionada a suscitar (com “ruído” e irritação) alterações na
      semântica e no património tradicional de um sistema funcional autopoiético
      como o direito -  Klaus-Jurgen
      Philippi, Kurt Lüscher, Rüdiger Lautmann, Karl-Dieter Opp, Richard Münch,
      o citado Talcott Parsons, Trutz Rendtorff, Eilert Herms, Wolfhart
      Pannenberg, o próprio autor em Die Allgemeingültigkeit der Religion,
      Gerhard Sauter e Frithard Scholz -.  
      
      
       
      II.
      Em especial, a estrutura do texto e a reconstituição da investigação.
      
       
      Com
      este artigo – denso e rico de conteúdo – Luhmann procura obter,
      fundamentalmente, como vimos, respostas para a questão da recorrente
      dificuldade de relacionamento entre o direito e a sociologia, podendo ser
      encontrados, na sua abordagem, quanto a nós, quatro grandes domínios temáticos
      (que não correspondem à divisão numérica inscrita no texto). 
      
       
      Nessas
      quatro áreas temáticas vamos encontrar o inventário de grande parte da
      conceptologia luhmanniana, desde logo os conceitos fundamentais
      salientados nas aulas do Prof. Guibentif de “sistema social”, de
      “diferenciação funcional” e de “articulação estrutural” entre
      cada um dos sistemas e o seu ambiente.
      
       
      Na
      primeira parte trata, Niklas Luhmann, da génese da sociologia e do seu
      objecto, onde se vai discernindo um enquadramento histórico do
      relacionamento entre a sociologia e o direito e as abordagens daquela ciência
      social à teoria e dogmáticas jurídicas.
      
       
      Depois,
      numa segunda etapa, traça o horizonte de caracterização dos sistemas
      auto-referentes e do seu modo de operação autopoiético com recurso ao
      sentido de identidade e diferenciação do sistema, incluindo nessa
      categoria o direito. 
      
       
      Essa
      caracterização -  dos
      sistemas auto-referentes - é articulada da seguinte forma:
      
       
                 
      - os sistemas
      auto-referentes (autopoiéticos) são fechados quanto à sua reprodução
      mas também simultaneamente abertos porque a reprodução se concretiza
      num ambiente de irritação e perturbação constantes, em que a “ressonância”
      de um dado sistema depende das suas estruturas internas e dos seus estados
      momentâneos e em que a sua autonomia se concebe como auto-regulação das
      suas dependências e independências por vias de mecanismos articulados de
      fechamento e de entrada no sistema; 
      
       
                 
      - os sistemas
      auto-referentes empregam o sentido como modo de operação autopoiética,
      observando-se e descrevendo-se a si mesmos, reintroduzindo a sua própria
      unidade como identidade do sistema e diferenciação deste relativamente
      ao seu ambiente; 
      
       
                 
      - os sistemas
      auto-referentes encaram a sua própria identidade sistémica como operações
      tautológicas (“para o sistema jurídico é direito o que é direito
      para o sistema jurídico” - assim, “La observación sociológica do
      direito”, op. cit., pp. 80-81); 
      
       
                 
      - os sistemas
      auto-referentes geram paradoxos internos e 
      uma teia confusa de hierarquias em virtude da operação de
      auto-referência e da utilização da negação no funcionamento interno e
      normal do sistema, originando por vezes colapsos por via da diferença
      entre sistema e ambiente aplicada dentro do próprio sistema; 
      
       
                 
      - os sistemas
      auto-referentes reproduzem um discurso interno pelo qual se tende a
      ocultar o paradoxo e a tautologia, afastando, por encobrimento, a expressão
      da arbitrariedade e do bloqueio nas operações respectivas; e
      
       
                 
      - o direito é
      um sistema auto-referente e autopoiético que baseia as suas distinções
      básicas e a sua identidade no código binário específico Recht /
      Unrecht (lícito / ilícito ou pretensão fundamentada / pretensão não
      fundamentada).
      
       
      A
      partir dessa caracterização dos sistemas auto-referentes Luhmann vai
      partir para o desenvolvimento de um método comparativo que fundamenta a
      análise sociológica do direito como observação alheia ou heterónoma
      do jurídico.
      
       
      Assim
      colocado, munido já desse instrumento dual de análise (“auto” e
      “hetero” observação), Luhmann percorre, num terceiro passo, a sucessão
      das questões mais críticas da teoria e da dogmática jurídicas,
      enfrentando o desafio de delinear as explicações que dão corpo ao seu
      pensamento sistémico sobre o direito, isto a propósito da normatividade
      jurídica, da positividade e da validade do direito, da orientação pelas
      consequências, da argumentação jurídica e do princípio da justiça. 
      
       
      Afirma,
      nesta mesma terceira parte do artigo, um conceito sociológico de norma,
      depois de discutir os pressupostos do sentido jurídico-normativo perante
      os factos e numa inserção sistémica de auto-referência, em que
      preponderam as funções primárias atribuídas ao direito, como mecanismo
      de “institucionalização”, traduzidas no “assegurar expectativas”
      e no “direccionar condutas”. 
      
       
      Ultrapassando
      o enquadramento histórico da validade e da positividade do direito, com o
      delineamento progressivo da lei enquanto argumento maior da validade do
      direito e o afastamento da legitimação do jurídico para as áreas do
      político, vai conceber, ainda, a positivização do direito enquanto recíproco
      da diferenciação do sistema jurídico e da sua autonomia autopoiética.
      Isto é, a validade do direito só é possível se for “positiva”, o
      que é dizer, se for colocada pelo próprio direito, embora essa mesma
      validade esteja inserida num ambiente de relativa instabilidade que admite
      modificações fundadas numa decisão gerada no próprio sistema jurídico
      e com ele congruente. Neste ponto, afirma Luhmann, a observação sociológica,
      externa ao sistema, é capaz de compreender melhor, por exemplo, as razões
      do défice de legitimação do sistema jurídico e da justiça quando
      fragilizados pela comunicação social, descobrindo como auto-referência
      a autopoiesis do direito e como tautologia a unidade do sistema
      simultaneamente referente e referido (“La observación sociológica del
      derecho”, op. cit., pp. 91)  
      
       
      Por
      outro lado, neste mesmo terceiro ponto, Luhmann confere grande importância
      aos desenvolvimentos da chamada dogmática da “orientação pelas
      consequências”, considerando de alguma forma estranha ao sistema essa
      “viragem empírica”, isto porque se torna simultaneamente necessário
      e impossível ao jurista o encontrar-se preocupado pelos interesses
      afectados pela decisão jurídica e o conhecer as consequências futuras
      da sua actividade, desde logo por via da incerteza natural do futuro e da
      autoridade legal e formal que foi conferida às suas resoluções. Ainda
      assim, esclarece Luhmann, a orientação pelas consequências apenas pode
      ser reconhecida como um atributo das prerrogativas oficiais do poder
      legislativo e do poder judicial e não para os “clientes normais” do
      sistema, sob pena de se vir a gerar um preocupante colapso na comunicação
      auto-referencial do direito (na operacionalidade do código recht /
      unrecht) e de se vir a reduzir o direito a uma engenharia social. Caberá
      então ao sociólogo, segundo define Luhmann, impor uma razoável distância
      entre o uso oficial e não oficial do direito, segundo a qual a programação
      das decisões estipule um conjunto de critérios segundo os quais os que
      venham a ser afectados pelas decisões não possam escolher para si próprios
      os pressupostos dessas mesmas decisões.   
      
       
      Também
      assim, no domínio da análise da dogmática jurídica, Luhmann segue com
      a análise da teoria da argumentação jurídica, assumida como a busca de
      formas e possibilidades da racionalidade e da fundamentação das opiniões
      e das decisões jurídicas, sobretudo no apelo à tópica e à retórica,
      sempre encaradas como um sintoma da diferenciação do direito. O
      interesse pelos modos de argumentação, que fizeram, na opinião de
      Luhmann, quase esquecer os efeitos sociais do direito, são aqui tomados,
      não como mera busca de razões/fundamentos ou de um reforço das
      potencialidades de persuasão/convencimento, mas sobretudo como formas de
      obtenção de um consenso apoiado intersubjectivamente (na acepção de
      Habermas ou de Alexy). Para resolver a incidência casuística e aleatória
      da realidade factual o direito intervém estabelecendo entre os casos uma
      conexão jurídica, uma causalidade e uma problemática com recurso aos
      meios internos de autodescrição do sistema jurídico, sendo essa função
      assumida pela argumentação (veja-se a menção à “argumentação
      problemática” de Viehweg). Ainda aqui o sistema intervém com o seu método
      sistemático, como conexão autolimitativa dos argumentos, sempre tendo a
      redundância como elemento integrante ou evento contextualizante. Neste
      enquadramento a sociologia, enquanto hetero-observação, deve perguntar
      sobretudo pela função da argumentação não se contentando aqui com a
      resposta tautológica da disponibilização de fundamentos ou razões,
      antes verificando que ao se imporem estruturas regulativas da vida
      quotidiana se incrementa a casuística como reacção imunitária da vida
      ou a componente acidental da vida social. A argumentação actua aqui,
      nessa óptica, como “contraveneno”, quebrando o concretismo e a
      complexidade incontrolável do detalhe, impondo limites sistemáticos à
      incerteza circulante do sistema jurídico e superando a clausura inerente
      a esse funcionamento.
      
       
      Sobre
      o problema da justiça Luhmann defende que a estruturação do sistema jurídico,
      organizado nas suas operações segundo a diferença recht / unrecht como
      código e programação, vem romper com a histórica arquitectura hierárquica
      encimada pela perfeição do bom, do verdadeiro e do justo, pois aquele
      outro mecanismo moderno (actual) de diferenciação do direito veio
      mediatizar todos os demais códigos (v.g. verdadeiro/falso e útil/danoso).
      A reflexão interna do sistema coloca vários problemas distintos no que
      respeita à ideia de justiça, estando o enquadramento desta inserido numa
      dimensão de dificuldade e de acordo com a complexidade inerente ao
      sistema jurídico. O princípio da justiça, nesse delineamento, está em
      ligação com a componente de redundância de toda a argumentação, com o
      postulado da determinação do direito por ele próprio, com a teoria da
      reprodução fechada, autopoiética e auto-referente do sistema jurídico
      e com o influxo desordenado de todos os elementos externos ao direito. A
      dualidade auto-observação / hetero-observação entra aqui como factor
      de redução dessa complexidade, com o enunciado das condições
      estruturais de que derivam, na sociedade moderna, a diferenciação
      funcional dos sistemas jurídico e científico.
      
       
      Numa
      quarta e última parte, Luhmann, em jeito de conclusão, questiona-se
      sobre a utilidade do papel da sociologia do direito, tanto no plano
      interno do desenvolvimento da teoria sociológica como a propósito da
      influência dessa mesma disciplina no contexto mais vasto da investigação
      interdisciplinar. 
      
       
      Planos
      esses em que as diferenças indissolúveis entre a auto-observação e a
      observação alheia do sistema jurídico servem para fundar, afinal,
      embora com grandes reservas relativamente a interpenetrações que não
      sejam ocasionais, um sentido unitário do reconhecimento do idêntico na
      diferença com a ampliação dos âmbitos de contacto mediante a discussão
      teórica direccionada a suscitar (com “ruído” e irritação) alterações
      na semântica e no património tradicional de um sistema funcional autopoiético
      como o direito. Tudo isto com o esclarecimento das condições estruturais
      que derivam da diferenciação funcional dos sistemas jurídico e científico
      nas sociedades modernas e com um cepticismo marcado quanto às vulgares
      apreciações distintivas teoria / experiência ou teoria / prática.
      
       
      A
      sociologia enquanto observação externa e distanciada do sistema jurídico
      pode oferecer, afinal, à auto-observação da teoria do direito, afirma
      Luhmann, um outro sentido e uma outra superfície visível aos temas
      centrais suscitados: a normatividade jurídica, a positividade e a
      validade do direito, a orientação pelas consequências, a peculiaridade
      da argumentação jurídica e o princípio da justiça.
      
       
      III.
      Conclusões e apreciações finais.
      
       
      O
      texto apresenta-se – assim tivemos ocasião de afirmar logo de início
      – como uma súmula do pensamento mais actualizado de Luhmann sobre a análise
      sociológica do direito, já enquanto teórico dos sistemas e portanto com
      uma visão descomprometida e portanto mais objectiva sobre as duas
      disciplinas em causa: a sociologia e o direito. 
      
       
      Quanto
      a este último ficaram bem demarcadas neste artigo todas as questões que
      preenchem a visão de Luhmann sobre o jurídico, não já como estrutura
      funcional da sociedade (como acontecia na primeira fase da sua investigação
      teórica) mas sim como (sub-)sistema integrado no mais vasto sistema
      social, paradigma que dá sentido à localização do direito na sociedade
      (o 1º capítulo do mais recente “O Direito na Sociedade” é dedicado,
      justamente, à tarefa de localização da teoria do direito). 
      
       
      A
      proposta de Luhmann lançada neste artigo pode, na nossa óptica, ter a
      seguinte leitura: é preciso conhecer a “chave” deste sistema jurídico
      para melhor conseguir lidar com as suas características essenciais e com
      o seu mecanismo vital. O seu fechamento funcional e identificador e os
      limites da sua abertura, assumidos como condições da sua análise e da
      produção de modificações na sua estrutura e na sua substância.
      Apontando qual a estratégia e os instrumentos para conseguir as reformas
      do direito e dos seus subsistemas.    
      
      
       
      São
      particularmente ricas de consequências, quanto a nós, neste artigo, as
      explanações de Luhmann relativas: 
      
       
      a.
      - À natureza comunicante do sistema jurídico enquanto inserido na
      sociedade, que, embora autopoiético e fechado quanto à sua diferenciação,
      pode sempre servir (quanto a nós) - e tem servido - de fundamento
      sofisticado a visões mais humanizadas da vida do direito, em que o humano
      (indivíduo) possa vir a ser articulado essencialmente com o social, na
      dimensão irrecusável da linguagem, da palavra e da comunicação de
      onde, verdadeiramente, quanto a nós, 
      ressalta o fenómeno do jurídico. Esta acepção formula que toda
      a comunicação humana em geral, encarada no seu aspecto central de meio
      de entendimento e de coordenação da acção (no estabelecimento de relações
      interpessoais), além de carrear uma pretensão de verdade ou de
      autenticidade (de fidelidade à própria identidade pessoal), desperta nos
      outros expectativas quanto à futura conduta do agente. No fundo a essência
      de todo o agir ou interagir comunicativo de que fala Habermas, que se
      integra de forma radical nas funções primárias atribuídas, por
      Luhmann, ao direito, como mecanismo de “institucionalização”. Funções
      estas traduzidas no “assegurar expectativas” e no “direccionar
      condutas”, e que se conjugam, num segundo momento de análise, na dimensão
      normativa do jurídico. “Assegurar desde logo a confiança fundada nas
      condutas comunicativas das «pessoas responsáveis», fundada na própria
      credibilidade que estas condutas reivindicam.” “(...) Dirigir e
      coordenar dinamicamente a interacção social e criar instrumentos aptos a
      dirigir e coordenar essa interacção, por forma a alterar as
      probabilidades de certas condutas no futuro”, podem ser as melhores
      definições dessas “funções primárias” do direito (Baptista
      Machado).
      
       
      b.
      - Ao carácter tautológico e paradoxal do funcionamento do sistema jurídico
      que convive, para a sua integridade e consistência, com um discurso de
      encobrimento e de apologia da perfeição normativa, sabendo-se que se
      encontra cada vez mais disseminada essa ideia desconstruída e
      transparente do direito, pressuposto das novas visões sobre o jurídico.
      O direito encarado nas características pretendidas da ductilidade, da
      flexibilidade, da reflexibilidade e da maleabilidade, mais preparado a
      lidar com o caos do que com a ordem, privilegiando a regulação ao
      dirigismo normativo, colmatando os colapsos do funcionamento do código
      binário ou, noutra perspectiva (Teubner: 2001), motivando o funcionamento
      de cadeias de códigos binários próprias de um direito pluri-contextual
      (resultado da complexificação do mecanismo da articulação estrutural)
      por virtude do fenómeno de globalização e da clarificação desse
      pluralismo jurídico (v.g. lex mercatoria v. legislação estatal). 
      
      
       
      c.
      - Às potencialidades explicativas da hipótese autopoiética que não
      podem deixar de servir, também, para o delineamento dos elementos
      constitutivos do sistema judicial (sub-sistema de realização ou aplicação
      do direito) e da procura dos seus referenciais organizativos e de interacção,
      dos padrões do discurso comunicativo que alimentam a sua subsistência e
      perpetuidade (comunicação enquanto processo dinâmico, circular e
      auto-perpetuado de interacção simbólica). 
      
       
      d.
      - E, por último, ao reconhecimento de uma fórmula de obtenção de um nível
      melhor e maior de relacionamento do direito com as ciências sociais que
      com ele concorrem na percepção e na actuação sobre a realidade social.
      Numa altura em que se convocam novas lógicas “post-disciplinares”
      para compreender determinadas questões que são transversais aos vários
      domínios sociais e humanos, e em que se acentua um certo relativismo ético-político
      que admite como admissível a diversidade (pluralidade) de respostas e de
      opiniões relativamente aos mesmos problemas (numa conjugação de forças
      centrífugas), não deixa de ser no mínimo interessante a fórmula
      apontada por Luhmann para obter um sentido unitário do reconhecimento do
      idêntico na diferença, com a ampliação dos âmbitos de contacto entre
      o direito e a sociologia, mormente a discussão teórica direccionada a
      suscitar (com “ruído” e irritação) alterações na semântica e no
      património tradicional de um sistema funcional autopoiético como o
      direito; uma perspectiva de grande enriquecimento teórico e prático para
      um jurista (disse “teórico” e “prático” quebrando aqui o
      cepticismo melancólico - desencantado - de Luhmann para com a clássica
      distinção kantiana razão teórica / razão prática), no confronto
      gerado com análises diferenciadas das suas categorias e artefactos próprios,
      alargando os seus horizontes de compreensão das realidades jurídica e
      social e possibilitando-lhe uma outra geografia para, talvez quem sabe,
      traçar novas fronteiras para o direito ou fundar novos saberes
      alternativos. 
      
      
       
      C.
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