Instituto
Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa - ISCTE |
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Novas
Fronteiras do Direito
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O
direito constrói-se hoje em novos territórios. Os processos de integração
europeia e de globalização, ainda que de âmbitos e efeitos distintos, têm
induzido inovações consideráveis na substância do direito e nos modos da
produção jurídica, questionando conceitos, princípios e formas de exercício
do poder há muito consagrados. Ao
longo dos seus 50 anos de existência, a Comunidade Europeia (CE) deu origem,
por um lado, a um corpo específico de normas e de princípios gerados em obediência
aos imperativos da construção de uma associação de Estados (vide os princípios
do efeito directo e do primado do direito comunitário sobre os direitos
internos, a ausência de reciprocidade nas relações entre os Estados); e, por
outro lado, à adaptação e profunda transformação dos direitos nacionais,
inclusive do direito constitucional (principalmente, por via da harmonização
ou unificação legislativas e da jurisprudência do TJCE). No advento da
“constitucionalização” da União Europeia , é quiçá legítimo falar de
um direito comum europeu. Ficou célebre a frase de Lord Denning, proferida em
1974, segundo a qual o direito comunitário é como “uma maré-cheia que se
propaga aos estuários e escala os rios”. Esta vaga tem tido igualmente
consequências no plano institucional: a evolução das estruturas e
procedimentos de regulação que acompanha a contínua expansão das competências
das instituições europeias contribui para redesenhar o quadro regulador à
escala interna. A CE tem sido singularmente permeável à introdução de novos
princípios, regras e procedimentos em áreas como a regulação do ambiente, da
segurança, das novas tecnologias (o princípio do desenvolvimento sustentável,
o princípio da precaução, os direitos dos utentes de serviços públicos,
etc.) e no domínio institucional (e.g. as agências reguladoras europeias). O
direito internacional público, baseado no princípio da soberania dos Estados,
continua a ser a fonte, por excelência, da ordenação das relações entre
Estados. Mas o aumento dos fluxos de pessoas e de bens, de informação, de
investimento e de tecnologia, e também de riscos, que compõem a chamada
“globalização”, questiona a capacidade dos Estados como garantes
exclusivos do desenvolvimento social, da democracia e da justiça. Emergem
normas e princípios que se impõem aos poderes políticos nacionais em obediência
a uma ideia de public good mundial. Novos conceitos (como o de cidadania global
ou de património comum da humanidade), novos actores, como a sociedade civil
internacional, e novos sistemas de regulação penetram pouco a pouco a esfera
internacional, rescrevendo o significado das fronteiras estatais. Embora aquém
do processo de europeização, a fase actual da globalização não deixa de
abalar as fundações da ordem mundial, abrindo passagem a uma mais complexa
forma de organização política e de governação que vai fazendo o seu caminho
em áreas como a dos recursos naturais globais, o clima, o comércio, o crime
internacional, ou a protecção dos direitos de populações civis. A
europeização e a globalização requerem a revisão das teorias e metodologias
de análise que tratam os Estados, as sociedades, e as ordens jurídicas como
sistemas fechados e estáveis. O novo ritmo da mudança tem levado a defender a
necessidade de complementar uma ciência jurídica tradicionalmente dogmática,
orientada para o levantamento e análise, de base textual, da lei, da jurisprudência,
da decisão administrativa, por um conhecimento mais aprofundado não só das
formas e conteúdos normativos, como dos fenómenos e problemas subjacentes. O
contributo de outras ciências humanas e sociais emerge, nesta perspectiva, como
essencial para o desenvolvimento de um pensamento jurídico mais criativo que não
só procure entender as forças e dinâmicas que impulsionam a evolução do
direito, como se adapte melhor às necessidades de renovação da ordem jurídica.
As novas tendências da regulação jurídica nos domínios económico e social
surgem, neste quadro, como um terreno de observação privilegiado. O
objectivo deste Seminário é encorajar o debate sobre algumas das principais
mudanças da regulação jurídica induzidas pelos novos territórios e das
implicações daí decorrentes para uma nova agenda de investigação jurídica.
O Seminário será organizado em torno de quatro grandes temas: 1.
Globalização e direito. 2.
Europeização e direito. 3.
Novos princípios, novos direitos e novos modos de regulação. 4.
Para uma nova agenda de investigação jurídica. É intenção dos organizadores reunir os textos das intervenções num volume a publicar posteriormente.
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